Por Sergius Gonzaga
Nos últimos anos, a UFRGS começou a incluir na lista de Leituras Obrigatórias do vestibular textos de um gênero até então desconsiderado como literário: o do depoimento pessoal.
Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus foi o primeiro. Em 2019, Feliz Ano Velho, de Marcelo Paiva, foi o segundo.
Em vez do poema ou da narrativa ficcional (conto e romance), o depoimento que se manifesta em forma de livro centra-se diretamente na exposição de fatos marcantes vividos pelo (a) narrador (a).
Seja por sua originalidade, seja pela força dramática, ou seja, ainda por sua representatividade, isto é, por seu poder de simbolizar as vivências de um grupo social ou de uma época, esse tipo de relato, quando preenche uma ou mais das características referidas, encontra um público receptivo, predominantemente jovem.
No mais das vezes, trata-se de um documento humano que sintetiza experiências desconhecidas dos leitores, oferecendo um conhecimento imediato da vida real.
No Brasil, um exemplo bem conhecido são as Memórias do cárcere, de Graciliano Ramos, em que o autor registra sua passagem de seis meses em prisões, logo após a Intentona Comunista (1935), na qual – diga-se de passagem – Graciliano não teve qualquer participação.
Outros exemplos são O que é isso, companheiro?, de Fernando Gabeira e Os carbonários, de Alfredo Sirkys – obras-primas da literatura testemunhal. Ambos os depoimentos referem-se ao universo guerrilheiro de fim dos anos 60, com denúncia da brutalidade do regime militar (tortura, assassinatos), mas também com forte autocrítica dos autores em relação a via armada como solução para o Brasil.
No vestibular deste ano, certamente encontremos questões sobre Feliz Ano Velho. Apesar de todo o sofrimento do autor, dilacerado pela invalidez física e pelo assassinato de seu pai nos porões da ditadura militar, o livro em seu final mostra a força da resistência humana e a coragem de um jovem no enfrentamento de seu infortúnio.
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